Apreciação da denúncia contra réus réus ligados às Forças Armadas preocupa ministros.
O Supremo Tribunal Federal (STF) se prepara para um dos julgamentos mais sensíveis desde o início das ações penais relacionadas aos ataques golpistas de 8 de janeiro. Trata-se da análise das denúncias contra os réus do chamado Núcleo 3, grupo composto por acusados de envolvimento direto na organização logística e operacional da tentativa de golpe. O julgamento está marcado para os dias 8 e 9 de abril e já mobiliza internamente a atenção de ministros, técnicos e equipes de segurança institucional da Corte.
Este núcleo é composto majoritariamente por militares, alguns com histórico em unidades de elite das Forças Armadas e forças especiais, o que adiciona uma camada de tensão ao processo. A atuação desses réus é considerada estratégica para a concretização dos ataques — seja pela capacidade operacional, seja pela experiência em ações táticas.
Nos bastidores do STF, há uma leitura consolidada de que esse julgamento não será apenas jurídico: será também um teste para a estabilidade institucional e a resposta das corporações militares.
O receio principal da Corte está no perfil das defesas desses réus. Segundo fontes com trânsito no Supremo, há preocupação de que bancas de advocacia adotem uma linha menos técnica e mais performática, apelando para discursos políticos, ideológicos e até provocativos.
Em vez de sustentações centradas em teses jurídicas, há expectativa de que algumas defesas busquem tensionar o ambiente da sessão, fazendo do julgamento um palco de contestação pública ao STF e às instituições democráticas.
Os réus do Núcleo 3 também têm chamado a atenção por outro motivo: a simbologia associada à sua presença nos atos. Nos corredores do Supremo, alguns desses acusados são informalmente mencionados como integrantes do grupo dos kids pretos — uma referência à estética militarizada adotada por certos manifestantes no dia 8 de janeiro.
O coronel Bernardo Romão Corrêa Neto, dos kids pretos do Exército, é um dos militares que vai a julgamento na semana que vem (Foto: Reprodução)
O uniforme preto, acessórios táticos e conduta coordenada dos grupos que atuaram como elemento de intimidação e demonstraram certo grau de organização. A presença desses perfis entre os réus reforça a percepção de que esse julgamento vai além da responsabilização penal individual: trata-se também de afirmar os limites institucionais frente a setores radicalizados do aparato militar.
Para os ministros e seus interlocutores ouvidos reservadamente, há risco concreto de que o julgamento seja utilizado como plataforma de disseminação de teses conspiratórias, falas antidemocráticas ou insinuações de perseguição contra os militares. Essa estratégia já foi parcialmente testada em sustentações orais anteriores, mas agora há temor de que, diante da visibilidade do julgamento do Núcleo 3, as bancas mais alinhadas a esse grupo busquem ampliar o alcance midiático dessas mensagens.
Apesar de não envolver diretamente figuras centrais do governo anterior, como o próprio Jair Bolsonaro, o julgamento do Núcleo 3 é considerado, nos bastidores da Corte, um dos mais importantes da atual fase. Isso porque trata do núcleo executor da tentativa de golpe, com foco nos agentes que deram suporte técnico e tático às invasões. E é justamente esse caráter “operacional” dos réus — associado à politização das defesas — que torna esse julgamento um divisor de águas na condução dos processos relativos ao 8 de janeiro.
Nos bastidores, ministros e assessores já discutem formas de manter a sessão sob controle, especialmente no que diz respeito à manutenção da ordem e do respeito aos parâmetros jurídicos. O Supremo quer evitar que o plenário vire palco de ataques institucionais ou tentativas de propaganda política. Ainda que a expectativa seja de que a maioria das defesas mantenha o tom institucional, há consenso de que será preciso estar preparado para eventuais excessos nas redes sociais e entre apoiadores dos réus.
Mesmo sem o peso simbólico do julgamento de Jair Bolsonaro, o caso do Núcleo 3 se impõe como um desafio estratégico para o Supremo Tribunal Federal. Além de colocar em julgamento uma das faces mais organizadas da tentativa de golpe, ele confronta diretamente a relação entre instituições civis e militares em um cenário ainda permeado por tensões, ruídos e memórias recentes de insubordinação.
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